Agricultores denunciam pressão para deixar terras e até destruição de casas em vila no interior de RR: 'Quebraram tudo'

  • 03/12/2025
(Foto: Reprodução)
Agricultores denunciam pressão para deixar terras em Vista Alegre, Caracaraí "Não posso sair daqui para ir para debaixo da ponte e dar para esse cidadão tudo o que consegui com trabalho", diz o agricultor João de Deus, de 66 anos, um dos moradores que denuncia grilagem de terras na comunidade Vista Alegre, em Caracaraí, região Sul de Roraima. A apreensão na fala dele reflete o clima de tensão vivido por ao menos 20 agricultores nos arredores de Vista Alegre. Eles denunciam que em 2020 o fazendeiro Olavo Aloisio Prevendi Benedini apareceu na região e, desde então, tem reivindicado posses de terrenos, pressionado famílias e até derrubado casas. ✅ Clique aqui para seguir o canal do g1 RR no WhatsApp Vista Alegre fica na zona rural de Caracaraí, 152 quilômetros de Boa Vista. O g1 e a Rede Amazônica estiveram na região e ouviram moradores que vivem a incerteza sobre o futuro do lugar onde moram. Segundo eles, a área que Olavo afirma ser dono tem aproximadamente 5 mil hectares e engloba não apenas os lotes rurais com produções agrícolas, mas também parte da zona urbana da vila, incluindo estruturas públicas como o campo de futebol e o cemitério da comunidade. Agricultor João de Deus, de 66 anos, em frente de casa, em propriedade reivindicada por grileiro em Vista Alegre, Caracaraí João Gabriel Leitão/g1 RR João de Deus vive na comunidade há mais de seis anos, em um lote onde cultiva plantações de banana e macaxeira. O documento que ele tem da terra é um contrato de compra e venda autenticado no Cartório de Registro de Imóveis de Caracaraí. Recentemente, recebeu uma intimação judicial referente a uma ação de reintegração de posse movida por Olavo na Vara Cível do município. Agora, o agricultor tem até o dia 8 de dezembro para se defender no processo. Ele conta que até cogitou sair da região para evitar um conflito maior, mas para isso teria de ter um valor que desse para se estabelecer em outro lugar. "Ele propôs me pagar 10 mil reais para deixar meu lote. Eu falei que não aceitava. Como é que eu vou sair? O que eu vou comprar por aí? Falei para ele que se ele me desse 150 [mil] para comprar outro numa vicinal, eu saía no mesmo dia", assegura o morador. O Instituto de Terras e Colonização de Roraima (Iteraima) informou que não localizou nenhum registro ou emissão de título definitivo em nome de Olavo na região, o que sugere que os títulos apresentados na Justiça têm origem privada ou registrada apenas em cartórios. No entanto, o instituto destacou que para confirmar plenamente a titularidade teria de ser realizada "consulta aos cartórios competentes, a fim de verificar registros e matrículas que não constam na base administrativa do Instituto." Divergência de registros Para tentar provar a posse antiga da terra e rebater a ação de reivindicação de Olavo, os moradores têm buscado auxílio jurídico de forma individual. Enquanto alguns contrataram advogados particulares, outros recorreram à Defensoria Pública de Caracaraí. A disputa esbarra nas seguintes divergências documentais: O Iteraima identificou que a região em disputa tem matrícula nº 3502 como válida Mas, a defesa de Olavo usa a matrícula nº 3235 em quatro ações judiciais de reintegração de posse. Segundo o advogado dele, a matrícula nº3502 é a atualização dos registros anteriores do imóvel. O presidente do Iteraima, Ionilson Sampaio, disse em entrevista à Rede Amazônica que a divergência nos registros pode ter ocorrido porque na época em que região passou a ser do estado, já havia sido titulada pelo Incra. "Possivelmente essa área foi titulada pelo Incra antes das transferências da Gleba para o estado de Roraima. Quando o Incra transferiu, lá já tinha título. O que já tinha título, ele excluiu, passou [ao estado] só o que sobrou", resumiu Entorno da vila de Vista Alegre, em Caracaraí, sul de Roraima, palco de conflito fundiário entre fazendeiros e agricultores Ronny Alcântara/Rede Amazônica A defesa de Olavo argumenta que ele é o legítimo proprietário da área registrada sob a matrícula nº 3502. O g1 consultou o Sistema de Gestão Fundiária, plataforma do governo federal que reúne informações de georreferenciamento de imóveis rurais, e encontrou áreas da fazenda Vista Alegre I, em nome de Olavo, localizadas na mesma região da vila onde vivem os produtores que se dizem pressionados por ele. A defesa dos moradores questiona a validade dos títulos apresentados por Olavo. Há relatos de que ele tem matrículas com datas divergentes para a mesma área reivindicada. Em nota a Defensoria Pública confirmou que já prestou orientações jurídicas a moradores da região e classificou a situação como "complexa". Segundo o órgão, o caso envolve documentos apresentados pelo suposto proprietário e, ao mesmo tempo, registros de órgãos oficiais apresentados pelos moradores, o que demonstra a "boa-fé na ocupação". Além da pressão judicial, os moradores relatam o uso de drones para monitorar e fotografar as propriedades, o que faz eles se sentirem inseguros e oprimidos. A defesa de Olavo alega que o uso de drones é apenas para "levantamentos de rotina" e controle interno da fazenda. "Enquanto eu estiver aqui, isso aqui é meu. O comprovante [de compra e venda] diz que eu não invadi nada de ninguém", finaliza João. 'Quebraram tudo' Outra moradora que enfrenta pressão para deixar a casa onde vive é a idosa Ilca Ferreira de Almeida, de 87 anos, que ainda vive o luto pelo que perdeu. Há dois anos, ela teve a propriedade destruída enquanto fazia tratamento de saúde em Manaus. Ilca Ferreira de Almeida, agricultora idosa que teve propriedade destruída por grileiros João Gabriel Leitão/g1 RR A agricultora atribui a responsabilidade da destruição ao suposto proprietário. "Ele apareceu aqui depois de ter queimado", conta ela, referindo-se à visita dele após as construções terem sido demolidas. "Os meninos ligaram: 'Mamãe, acabaram com seu terreno. Quebraram a casa, quebraram a cozinha do forno, quebraram tudo'. O que tinha lá, não tem mais nada. Ainda derrubaram árvores no caminho para ninguém passar", relembra a idosa. Em nota, a defesa de Olavo afirmou que as demolições ocorreram "somente após acordos firmados", nos quais, segundo ele, a maioria dos ocupantes aceitaram sair. A defesa sustenta que foram removidas apenas "estruturas abandonadas ou irregulares" para evitar novas invasões. Moradora antiga da região, Ilca guarda o documento sobre o cadastro do imóvel com data de 1988 emitido pelo Incra. Ela conta que ganhou o terreno de um antigo patrão. Sobre os documentos antigos, o Incra explicou que tratam-se de registros declaratórios para fins cadastrais, e não títulos definitivos de propriedade. Além disso, o Instituto disse que desde 2021 a Gleba Vista Alegre foi transferida para o estado. 🔎 O Incra é o órgão federal responsável pelas áreas que pertencem à União. Quando essas terras são repassadas ao estado, processo iniciado após Roraima deixar de ser Território Federal, a gestão passa ao Instituto de Terras de Roraima (Iteraima). Ilca tem ainda os recibos de pagamento da mensalidade paga à Associação dos Produtores Rurais de Vista Alegre, paga por moradores da área, que datam de 1995 e 1996. No local, dona Ilca havia construído com o próprio trabalho uma casa de farinha, um forno e plantações de macaxeira para sustentar a família. O cenário mudou drasticamente quando ela precisou viajar a Manaus para tratar uma úlcera. Ao retornar, encontrou o lote devastado. "Eu plantava tudo, mandioca, macaxeira, feijão... Era tudo o que tinha de comer". Indenização 'humilhante' A destruição das construções no imóvel de Ilca foi seguida de uma tentativa de acordo financeiro considerada humilhante pela família. Segundo ela, Olavo ofereceu R$ 20 mil para que abrisse mão definitivamente da terra. "Vinte mil reais não dá nem para uma semana. Eu gastei muito mais que isso só para levantar as construções que tinha lá. Não devia para ninguém, não roubei de ninguém", desabafa Dona Ilca. Atualmente, ela mora em uma casa na vila. Debilitada pela saúde e pela idade, Ilca já não tem forças para retornar à lavoura para plantar. Agora, ela pede por uma indenização justa que pague pelo patrimônio destruído. "Eu queria que indenizasse meu terreno, num valor melhor para eu passar até o fim da minha vida". Ainda em nota ao g1, a DPE declarou que moradores em situação de vulnerabilidade que receberam notificações judiciais ou extrajudiciais para deixarem seus lotes na região, procurem orientação jurídica o mais rápido possível na comarca de Caracaraí, para a análise do caso específico de cada um e definições das medidas cabíveis. Agricultor João de Deus teme perder as benfeitorias e plantações se for despejado de seu lote em Vista Alegre João Gabriel Leitão/g1 RR Decisões judiciais favoráveis a Olavo Até esta terça-feira (2), Olavo acumulava cinco decisões judiciais favoráveis a ele para reintegração de posse na região de Vista Alegre. A maioria utiliza como documentação, para comprovar a posse da propriedade, a área registrada sob a matrícula nº 3235 no Cartório de Ofício Único da Comarca de Caracaraí. Sobre a denúncia de invasão de áreas públicas como o campo de futebol e cemitério, a defesa negou irregularidades e disse que "inexiste qualquer sobreposição com área pública ou com a zona urbana da vila". O g1 procurou a Assembleia Legislativa de Roraima (ALE-RR) para saber se a Comissão de Terras acompanha conflitos fundiários na região, mas não houve resposta. A Prefeitura de Caracaraí também foi procurada para falar da disputa na Vila de Vista alegre, mas também não retornou. Leia outras notícias do estado no g1 Roraima.

FONTE: https://g1.globo.com/rr/roraima/noticia/2025/12/03/agricultores-denunciam-pressao-para-deixar-terras-e-ate-destruicao-de-casas-em-vila-no-interior-de-rr-quebraram-tudo.ghtml


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