IA, 5G e decisões em segundos: veja como será o 1º hospital inteligente do SUS no Hospital das Clínicas da USP
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O Ministério da Saúde deu, na sexta-feira (14), o passo final para a criação do primeiro hospital inteligente do Sistema Único de Saúde (SUS).
O acordo firmado com o Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP (HC-FMUSP) e com o governo de São Paulo autoriza a instalação do Instituto Tecnológico de Emergência —um novo prédio dentro do complexo, que será erguido do zero e equipado com sistemas digitais, inteligência artificial e rede 5G para integrar ambulâncias e equipes de emergência em tempo real.
As obras devem começar em 2026, com previsão de abertura entre 2028 e 2029. O investimento, de R$ 1,7 bilhão, é financiado pelo Banco dos BRICS (NDB) e integra uma rede nacional de serviços inteligentes que prevê a instalação de 14 UTIs de alta precisão nas cinco regiões do país.
Idealizadora do projeto, a cardiologista, intensivista e professora titular de Emergências da USP Ludhmila Hajjar explica ao g1 que a iniciativa coloca o Brasil na rota de uma tendência que já está consolidada em países como a China.
Hospital das Clínicas
Hospital das Clínicas
Lá, hospitais inteligentes funcionam como centros “neurodigitais” de urgência, unidades capazes de integrar ambulâncias, exames, banco de dados e equipes médicas antes mesmo de o paciente entrar pela porta.
“O paciente grave é o que mais se beneficia da inteligência artificial. O que estamos fazendo é reduzir etapas que hoje consomem tempo, fragmentam o cuidado e aumentam o risco”, afirma.
Triagem por gravidade e não mais pela ordem de chegada
Outra mudança central, segundo o projeto, é a forma como o paciente será priorizado. A triagem não dependerá apenas da avaliação presencial da equipe: o sistema de IA vai interpretar sinais vitais, idade, histórico, sintomas e exames transmitidos também antes da chegada.
“Hoje ainda existe muita subjetividade na triagem. Os sistemas inteligentes conseguem estabelecer níveis de gravidade com precisão e reduzir erros, além de antecipar decisões”, diz Hajjar.
Como funciona hoje e o que muda com o hospital inteligente
O pronto-socorro do Hospital das Clínicas não é um serviço de porta aberta. Ao contrário de uma UPA, onde qualquer pessoa pode chegar espontaneamente, o HC só recebe casos regulados —pacientes encaminhados por outras unidades da rede pública após uma avaliação inicial.
Isso significa que ninguém pode procurar o HC diretamente, mesmo em emergências graves. A entrada depende de uma vaga liberada pela Cross, o sistema de regulação do estado, ou por mecanismos equivalentes.
Esse processo, porém, ainda é feito à moda antiga: telefonemas, e-mails, trocas de mensagens e confirmações manuais de disponibilidade.
A maior parte dos pacientes vem de hospitais municipais, UPAs e prontos-atendimentos da Grande São Paulo, geralmente quando há necessidade de recursos que apenas o HC oferece --como neurocirurgia 24 horas, hemodinâmica, ECMO ou terapia intensiva altamente especializada.
O fluxo é padrão para hospitais de referência, mas lento e fragmentado. Entre a decisão de transferir e o início do tratamento, minutos se perdem. Não é raro que a vaga seja confirmada quando a ambulância já está a caminho ou até mesmo na porta do hospital.
É justamente nesse trecho crítico do percurso —da regulação ao primeiro atendimento— que o hospital inteligente pretende intervir.
A nova estrutura pretende concentrar todo o atendimento de urgência e emergência do HC, e nasce com a missão de reorganizar esse fluxo. Hoje, pacientes costumam ser atendidos conforme chegam, equipes aguardam resultados de exames liberados de forma intermitente e a comunicação entre unidades ainda depende de telefonemas e e-mails.
No modelo inteligente, esse intervalo é substituído por uma cadeia digital integrada. Com o uso de rede 5G, as ambulâncias passam a transmitir automaticamente sinais vitais, eletrocardiograma, imagens e localização para o hospital.
A inteligência artificial cruza essas informações com a disponibilidade de leitos, a especialidade necessária e o nível de gravidade, indicando qual unidade deve receber o paciente e quais equipes precisam ser acionadas.
Ludhmila Hajjar resume a diferença com um exemplo simples: hoje, um caso grave na periferia precisa aguardar a liberação da vaga; no novo modelo, esse tempo desaparece.
“A ambulância conectada identifica o hospital mais próximo com a primeira vaga disponível, e o tratamento começa ali, dentro da viatura. O hospital já sabe quem está chegando, qual é a suspeita e quais recursos preparar”, explica.
Segundo ela, a integração reduz etapas e devolve minutos que podem ser decisivos em situações como AVC, infarto, choque e trauma.
“Tempo é vida”, resume a médica.
Capacidade dobrada e impacto para todo o complexo do HC
A criação do novo instituto pretende absorver integralmente as urgências e emergências do HC e, ao mesmo tempo, dobrar a capacidade atual de atendimento.
Ao retirar essa demanda do prédio central, o hospital libera mais espaço para cirurgias eletivas, consultas especializadas e reabilitação.
“É uma reorganização de fluxo. O instituto não só amplia o atendimento: ele melhora o HC inteiro”, afirma Ludhmila.
O novo hospital será 100% SUS, sem atendimento por convênios privados.
Tecnologia importada e adaptada de países do BRICS
Como o projeto é financiado pelo NDB, parte substancial da tecnologia virá dos países do BRICS, especialmente a China, que concentra hoje cinco hospitais inteligentes considerados referência.
“A China está muito avançada na integração de IA com a emergência. Boa parte do que está sendo usado lá será adaptado para o nosso contexto. Cerca de 70% das soluções vêm dos países do bloco, e o restante de parceiros internacionais”, diz a médica.
A ideia, segundo ela, não é reproduzir modelos estrangeiros, mas nacionalizar tecnologias para um sistema universal e de grande escala como o SUS.
Segundo o projeto, o instituto também seguirá padrões ambientais elevados: será projetado para baixo carbono, com eficiência energética, reuso de água e processos automatizados que reduzem desperdício.
A sustentabilidade, afirma a médica, precisa ser vista como parte da segurança do paciente.
“Vamos ter um hospital altamente digital, mas centrado no paciente. Tecnologia só faz sentido se melhorar o cuidado e o ambiente humano”, diz.
Pioneirismo no HC, mas projeto prevê expansão
O HC será o laboratório inicial. Se o desempenho for positivo, o ministério deve ampliar o modelo para outras regiões –ainda sem definição oficial de onde.
“É um piloto de alcance nacional. A expansão existe no plano, mas precisa vir no tempo certo”, conclui Hajjar.FONTE: https://g1.globo.com/saude/noticia/2025/11/17/ia-5g-e-decisoes-em-segundos-veja-como-sera-o-1o-hospital-inteligente-do-sus-no-hospital-das-clinicas-da-usp.ghtml