Trama golpista: no segundo dia de julgamento, defesas pedem absolvição total de Augusto Heleno, Bolsonaro, Paulo Sérgio Nogueira e Braga Netto
Defesa de Heleno nega intenção golpista e diz que ele perdeu influência com o Centrão
Os advogados dos réus do núcleo crucial da trama golpista encerraram nesta quarta-feira (3) as argumentações no STF - Supremo Tribunal Federal, em contraposição às acusações da Procuradoria-Geral da República.
A defesa do ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional, Augusto Heleno, foi a primeira a se pronunciar. Questionou as provas colhidas pela Polícia Federal, alegou a dificuldade de acesso aos autos e afirmou que Heleno perdeu influência na segunda metade do governo de Jair Bolsonaro.
"Quando o presidente Bolsonaro se aproxima dos partidos dito Centrão e tem sua afiliação ao PL, inicia-se, sim, um afastamento no sentido da cúpula do poder. O general Heleno foi uma figura política importante tanto para a eleição quanto para o governo. Mas este afastamento é comprovado”, disse Matheus Mayer Milanez, advogado de Augusto Heleno.
A defesa também se manifestou sobre a agenda que a Polícia Federal apreendeu na casa de Augusto Heleno. Segundo a Procuradoria-Geral da República, as anotações de Heleno incluíam estratégias para tentar minar a credibilidade das urnas eletrônicas. A defesa negou e usou slides na apresentação.
"Eu trago uma explicação bem curiosa que são outras anotações sobre o Judiciário, para mostrar como esta agenda era somente um suporte da memória do próprio general. Essa defesa teve acesso à prova, e desmistificou essa caderneta, que de caderneta golpista não tem nada. É simplesmente um material de apoio do próprio general, não vinculada e não compartilhada com ninguém”, disse Matheus Mayer Milanez, advogado de Augusto Heleno.
No fim, o advogado afirmou que Augusto Heleno não pressionou militares para aderir a um golpe e não politizou o Gabinete de Segurança Institucional.
Defesa de Jair Bolsonaro afirma que não há nada que ligue o ex-presidente ao 8 de janeiro
Em seguida, a defesa do ex-presidente Jair Bolsonaro se manifestou. O advogado alegou que não foi possível analisar a totalidade das provas e, ao contrário do que afirma a PGR, disse que não há qualquer prova que ligue Bolsonaro aos planos golpistas e violentos, como o assassinato de autoridades e a invasão da sede dos Três Poderes.
"Não há uma única prova que atrele o presidente à ‘Punhal, ao Verde e Amarelo’, à ‘Operação Luneta’ e ao 8 de janeiro. Aliás, nem o delator que o sustenta, que mentiu contra o Presidente da República, nem ele chegou a dizer participação em Punhal, em Luneta, em Copa, em 8 de janeiro. Nós não tivemos acesso à prova e muito menos prazo suficiente. Nós não tivemos o tempo que o Ministério Público e a Polícia Federal tiveram. E nós não tivemos acesso às provas durante a instrução. Eu quero dizer a vossas excelências: com 34 anos, é a primeira vez que eu venho à tribuna com toda a humildade para dizer o seguinte: eu não conheço a íntegra desse processo. São bilhões de documentos, em uma instrução de menos de 15 dias, seguida de interrogatório. A instrução começou em maio, nós estamos em setembro”, disse Celso Vilardi, advogado de Jair Bolsonaro.
A defesa também criticou, diversas vezes, a delação do ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, Mauro Cid, a quem chamou de não confiável.
“Nas 16 vezes, ele mudou de versão diversas vezes. E isso não sou eu que estou dizendo. É, na verdade, o Ministério Público Federal e a Polícia Federal, no último relatório de novembro, quando se disse que ele tinha inúmeras omissões e contradições. Portanto, na verdade, ele apresentou uma versão e ele alterou essa versão”, disse Celso Vilardi, advogado de Jair Bolsonaro.
O advogado afirmou que Bolsonaro autorizou a transição de governo sem instigar apoiadores à ruptura democrática. Em resposta à acusação da PGR sobre a cadeia de eventos que levou à tentativa de golpe, a defesa do ex-presidente ressaltou que ele foi dragado para esses fatos e que, em momento algum, houve violência. E que, por isso, segundo o advogado, não é razoável uma condenação a 30 anos.
“A reunião, a live que deu margem à investigação do TSE, a reunião ministerial, a reunião com embaixadores e a reunião de 7 de dezembro... Esses fatos seriam, na verdade, o início de execução do crime de atentado, mas sem violência e grave ameaça? Dizer que o crime de abolição de Estado de Direito começou em uma live sem violência é subverter o próprio Código Penal",, disse Celso Vilardi, advogado de Jair Bolsonaro.
Contra a acusação da PGR de que Bolsonaro estava ligado a planos de ruptura democrática, um segundo advogado de defesa ressaltou que o ex-presidente discutiu instrumentos previstos na Constituição que ele não poderia adotar sozinho.
“Além de não pretender dar golpe de Estado, não teve nenhum intuito em ir adiante com o projeto criminoso apontado na denúncia. Fala-se que em tais reuniões se discutia Estado de Defesa e Estado de Sítio. Estado de Defesa e Estado de Sítio são atos protocolares previstos na Constituição. Estado de Defesa e Estado de Sítio são um dos atos mais colegiados da nossa legislação. Eles não são, como se pode pensar, um ato de força unilateral do Presidente da República”, disse Paulo Bueno, advogado de Jair Bolsonaro.
Advogado do ex-ministro da Defesa, Paulo Sérgio Nogueira, diz que ele tentou demover Bolsonaro de adotas medidas de exceção
O advogado de Paulo Sérgio Nogueira negou que o ex-ministro da Defesa tenha pressionado os então chefes das Forças Armadas a apoiarem o golpe. Segundo o advogado, a atuação de Paulo Sérgio foi em sentido contrário, para tentar demover Bolsonaro de adotar medidas de exceção.
“Nenhum comandante militar diz que foi pressionado. Vem um delator e fala que o general Paulo Sérgio era totalmente contrário a isso. Vem a principal testemunha de acusação e diz que o general Paulo Sérgio atuou para demover o Presidente da República. General Paulo Sério está provado que entregou discurso para acabar com isso. Tem um movimento, a prova dos nove, para tirar o general Freire Gomes e o general Paulo Sérgio do cargo. O general Paulo Sérgio é chamado de ‘melancia’, é tido por alguns como ‘frouxo’ e ‘melancia’. Ah, ele é um frouxo e melancia”, disse Andrew Fernandes, advogado de Paulo Sérgio Nogueira.
No fim da fala do advogado, a ministra Cármen Lúcia pediu que ele explicasse a que estava se referindo quando disse que Paulo Sérgio Nogueira tinha atuado para demover Bolsonaro. A resposta do advogado foi uma acusação ao ex-presidente Jair Bolsonaro.
“Vossa senhoria — eu copiei aqui cinco vezes — disse que o réu, neste caso, o cliente de vossa senhoria, ‘estava atuando para demover o Presidente da República. Demover de quê? Porque até agora todo mundo disse que ninguém pensou nada’", perguntou a ministra Cármen Lúcia.
“Claro, claramente, vossa excelência. Demover de adotar qualquer medida de exceção. Atuou ativamente, e há prova nos autos”, disse Andrew Fernandes, advogado de Paulo Sérgio Nogueira.
Defesa de Braga Netto critica delação de Mauro Cid, que não apresentou provas
A última defesa a falar foi a do general Braga Netto, que foi candidato a vice de Jair Bolsonaro na chapa eleitoral derrotada nas urnas em 2022. O advogado afirmou que as acusações se basearam em trocas de mensagens contidas em oito impressões de tela de celular e na delação de Mauro Cid, que, segundo a defesa, não apresentou provas, não teve a participação inicial do Ministério Público e teve pressão para os depoimentos.
“Esquece voluntariedade. Esquece voluntariedade. Foi coagido sim, e quem diz isso é ele. Não é esse advogado, não são os outros advogados que usaram a tribuna, é simplesmente ele. Portanto, a defesa entende que esse acordo está maculado por esses três vícios e ratifica o que disse quando recebeu a denúncia: este é o momento em que essa Corte pode rever essa decisão. O que nós temos contra Braga Netto é essa delação — que eu vou aqui a seguir rebater ponto por ponto — e oito prints contra Braga Netto?. Não é possível, não é possível”, disse José Luís Mendes de Oliveira Lima, advogado de Braga Netto.
Nas críticas da defesa à delação de Mauro Cid, os advogados destacaram a demora dele para revelar dois episódios: a entrega de dinheiro a Braga Netto e o encontro na casa do general, em que teriam sido discutidos os planos golpistas.
“É razoável imaginar que uma pessoa, que um delator, demore 15 meses para trazer esse fato ao eminente relator? Às autoridades? Ao Ministério Público? À polícia? É razoável imaginar isso? Eu, com a máxima vênia, acho que não. Acho, não. É um escândalo. É um escândalo ele esquecer esse detalhe. Não estamos falando de abotoadora, relógio, de um brinco. Estamos falando da entrega de um dinheiro para financiar um golpe de Estado. E vai se dar credibilidade a esse réu delator que mente descaradamente o tempo inteiro, que mente nesta Corte, que mente perante o interrogatório? Não é possível. Meu cliente está preso com base na delação dele. Como é que pode essa delação ficar em pé? Ela é um pó, ela é nada. Ela é uma farsa”, disse José Luís Mendes de Oliveira Lima, advogado de Braga Netto.
Os advogados de Augusto Heleno, Jair Bolsonaro, Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira e Walter Braga Netto pediram a absolvição dos clientes em todas as acusações.
O julgamento vai recomeçar na terça-feira (9) de manhã, com o voto do relator, o ministro Alexandre de Moraes. A conclusão está prevista para sexta, dia 12. Os ministros vão decidir se absolvem ou condenam os réus - e, nesse caso, qual será o tamanho da pena.
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Defesa de Bolsonaro diz que reuniões eram 'atos preparatórios' e não tinham violência ou grave ameaçaFONTE: https://g1.globo.com/jornal-nacional/noticia/2025/09/03/trama-golpista-no-segundo-dia-de-julgamento-defesas-pedem-absolvicao-total-de-augusto-heleno-bolsonaro-paulo-sergio-nogueira-e-braga-netto.ghtml